Muitos dos filmes de Cuarón tratam de perda, tristeza e solidão. Mas “Gravidade” é o mais deliberado ao sublinhar como a dor corrói uma pessoa, levando-a a perseguir o silêncio até ser forçada a reconhecer o que perdeu. Lançado há dez anos neste mês, o filme trata de uma história tão pessoal e íntima com impressionante grandiosidade.
A impressão do filme foi impressionante nos cinemas, igualmente vertiginosa e emocionalmente destrutiva. Ryan, de Bullock, sofreu uma perda impossível com a morte de sua filha, o que transforma o que poderia ter sido uma simples história de ação e aventura em uma que aborda os diferentes tipos de sobrevivência e o que significa perseverar em probabilidades cada vez mais implacáveis. Engenheira médica, ela decide embarcar em sua primeira missão de ônibus espacial, em parceria com o veterano astronauta Matt Kowalsky (George Clooney) em sua última viagem além da atmosfera antes de se aposentar. O que era para ser rotina toma um rumo dramático; a nave é destruída e os dois ficam sem nenhum resgate concebível. “Gravidade” casa a tragédia pessoal com o desastre iminente, enquanto Ryan é forçado a lidar com dois tipos diferentes de sobrevivência.
A impressionante solidão potencial do ser humano é uma tendência temática em todas as histórias de Cuarón. Em “A Little Princess” (1995), Sara Crewe chora, cercada por linhas de giz molhado, acreditando que seu pai se tornou uma causalidade da guerra. Cleo, interpretada por Yalitza Aparicio, sofre um natimorto traumático em “Roma” (2018) após um evento público violento que induz seu parto. Em “Children of Men” (2003), uma sociedade quebrada procura respostas no meio da crescente depravação do mundo quando a sugestão de uma nova vida – futuros maiores e prometidos – é subitamente retirada deles. Até mesmo “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban” (2004) aborda o que poderia ter sido, enquanto Harry lamenta pais que nunca conheceu, com duas figuras de proa que conheciam bem seus pais, Remus e Sirius, chegando em sua vida.
Uma das imagens mais memoráveis e intrinsecamente ligadas à sua carreira permanece em “Y tu mamá también” (2001). Luisa, de Maribel Verdú, está de costas para a câmera, de frente para o mar e contra a grande costa do oceano e uma decisão futura e devastadora. “Gravidade” (2013) literaliza isso. Na situação mais solitária e distante que uma pessoa pode imaginar, à deriva na infinidade do espaço, Ryan é forçado a um cálculo físico e cerebral da dor.
Muitas vezes, em filmes sobre o espaço, a plataforma que desafia a gravidade permite que um personagem expresse ou se contente com uma bagagem emocional e existencial. As loucuras da paternidade são investigadas em filmes como “Ad Astra” (2019), “Interestelar” (2014) e “Primeiro Homem” (2018). “Moon” (2009) oferece uma plataforma para um homem perceber sua mortalidade insignificante. “Gravidade” gira de forma revigorante para a maternidade e se concentra na ideia de que podemos viajar até os confins do universo, mas sempre estaremos presos nos limites de nossos pensamentos.
Fonte: www.rogerebert.com